Docente da UEPB indica solução para conter avanço da contaminação por cianobactérias das águas de Boqueirão
Diante do risco que Campina Grande e demais cidades abastecidas pelo Açude Epitácio Pessoa, em Boqueirão, estão enfrentando com a possível presença de cianobactérias no manancial, a professora do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Weruska Brasileiro Ferreira, indica uma alternativa para conter o avanço da contaminação da água do manancial e, assim, evitar futuros danos a saúde dos paraibanos.
Trata-se de um projeto de produção de microalgas para fins de biocombustíveis. Intitulado “Estudo da potencialidade da geração de biocombustíveis a partir das microalgas cultivadas em esgoto doméstico”, o projeto desenvolvido há dois anos visa ampliar o alcance da rede de saneamento e até universalizar o serviço. Financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o projeto prevê a transformação dos tanques de tratamento de esgoto em locais de cultivo de microalgas.
A ideia é tratar o esgoto doméstico através do cultivo das microalgas, promovendo a biorremediação desses dejetos, que são os contaminantes dos mananciais. Esse processo favoreceria a produção de biocombustível. “A cultura dessas microalgas aparece como alternativa para transformar os efluentes poluidores em diversos produtos sustentáveis”, ressalta Weruska.
Ela explica que o projeto não prevê a despoluição das águas de Boqueirão, o que exige técnicas avançadas, mas pode evitar o agravamento do problema a partir do trabalho de prevenção feito nos esgotos domiciliares. O tratamento adequado desses esgotos, segundo a docente, evitaria o avanço da poluição da água que corre para Boqueirão, deixando o açude em condições de receber as águas que futuramente virão com a transposição do Rio São Francisco.
A pesquisadora da UEPB explica que as microalgas são ricas em proteínas, lipídios e carboidratos que, cultivadas de forma específica, possibilitam a extração dessas substâncias que podem ser utilizadas para minimizar o impacto de nutrientes como nitrogênio e fósforo, que estão presentes no esgotamento de difícil remoção na estação de tratamento de esgoto.
As microalgas são vegetais unicelulares fotossintetizantes que podem ajudar a otimizar o saneamento. “Nos locais onde não há tratamento, o cultivo das microalgas ajuda a minimizar a carga poluidora. Onde não há tratamento existe o risco de grande impacto ambiental nos lençóis freáticos e fontes hídricas”, observa Weruska Brasileiro, apontando ainda que o cultivo desses micro-organismos tem a possibilidade de proporcionar outras alternativas que poderiam custear o investimento no saneamento básico no Estado. Ou seja, o projeto prevê a produção de biocombustíveis a partir do tratamento de esgoto.
A pesquisadora explica que esse cultivo poderia funcionar como peça fundamental de um processo de energia limpa e redutor dos males do efeito estufa. “Com a universalização do saneamento, é possível, através dos carboidratos e lípidos presentes nestes organismos, obter diversos biocombustíveis como o biodiesel e etanol, o que favoreceria no próprio financiamento de investimento feito no saneamento básico”, frisa.
Weruska lembra que para atingir a meta de universalização do saneamento, prevista na política nacional, o Brasil precisaria investir R$ 15 bilhões por ano, mas no ano passado só conseguiu gastar a metade desse valor. Com as microalgas, o país poderia tratar o esgoto doméstico, tendo um produto de valor agregado, que seriam as energias renováveis. “As energias poderiam financiar esse tipo de financiamento”, observa.
Boqueirão
A professora Weruska esclarece que a ocorrência da floração de cianobactérias no reservatório Epitácio Pessoa deve-se não apenas ao baixo nível de água que o manancial está registrando, mas principalmente devido ao excesso de nutrientes como fósforo e nitrogênio. Esses constituintes químicos, segundo a especialista, estão presentes no esgoto doméstico e em fertilizantes. No entendimento da professora da UEPB, a falta de tratamento do esgoto e as práticas agrícolas irregulares contribuem para o desenvolvimento de cianobactérias nos corpos hídricos.
“Faz-se necessário o tratamento de esgoto no nível de remover os nutrientes como nitrogênio e fósforo, para preservar as águas naturais. Caso contrário, além da escassez de água, teremos que enfrentar a escassez de água de qualidade adequada para consumo humano”, destaca. Na avaliação de Weruska, a potabilidade pode ficar ainda mais comprometida com a chegada do volume morto. De acordo com a professora, o tratamento da água de Boqueirão feito na Estação de Gravatá não é suficiente para retirar as impurezas e garantir que ela seja própria para o consumo humano, o que pode trazer riscos à saúde.
A engenheira alerta para o grave problema de saneamento no Brasil, principalmente no que diz respeito ao tratamento de esgoto. Segundo ela, hoje aproximadamente 57% do esgoto doméstico são coletados, mas apenas 39% são tratados. “Temos um déficit de tratamento de esgoto muito grande, o que acaba comprometendo os corpos hídricos, visto que muitos dos dejetos domésticos são lançados diretamente nos mananciais, o que acaba contaminando-os. É o que estamos vivenciando no Açude de Boqueirão: a proliferação de cianobactérias, que se desensolvem com nitrogênio e fósforo, os quais estão presentes no esgoto doméstico”, frisa Weruska.
Ela salienta que analisando o laudo sobre cianobactérias nas águas do Açude Epitácio Pessoa, divulgado pelo professor Janiro Costa, da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), é fato que em razão do número de cianobactérias presentes nas águas do reservatório ultrapassar os 20.000 cel/ml, necessita de monitoramento semanal de cianotoxinas, conforme preconiza a Portaria de Potabilidade D’Água, o que a Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (Cagepa) está seguindo criteriosamente.
No entanto, segundo a professora, “o que precisa ser alertado é com relação a capacidade de tratamento da estação de tratamento de água de Gravatá. Analisando o laudo, observa-se que a concentração de microcistina na água bruta (sem tratamento) é de 0,24mg/l. Após o tratamento este valor passa para 0,36mg/l. Com relação a concentração de um outro tipo de cianotoxina (a cilidrospermopsina), na água antes do tratamento tem-se 0,0mg/l e após o tratamento o teor passa para 0,5mg/l, o que representa um aumento de cianotoxina após o tratamento convencional existente na estação de tratamento de Gravatá. Isto, de fato, comprova a limitação de tratamento da referida estação para este tipo de problema”.
A pesquisadora destaca que este aumento de cianotoxinas na água tratada acontece, muito provavelmente, em razão da lise celular que ocorre durante o tratamento. “Felizmente os valores de cianotoxinas estão atendendo aos padrões de potabilidades. Mas chamo atenção que em razão da escassez das chuvas e o excesso de nutrientes presentes no reservatório de Boqueirão, a floração de cianobactérias tende a aumentar. Assim, precisamos antecipar as ações com relação ao tratamento, implementando técnicas de tratamento de água associando ao próprio tratamento convencional já existente, para que tenhamos condições de aumentar a capacidade de tratamento da estação em questão e evitarmos uma possível parada no abastecimento de água”, conclui Weruska.
Texto: Severino Lopes
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