Câmpus de João Pessoa sedia mesa de debate e exposição que resgata a memória dos 60 anos do golpe de 1964
Com o objetivo de preservar a memória do mais longo período de supressão das liberdades democráticas
no Brasil republicano, a ditadura, o projeto “Memória, sociedade e cidadania (MUDDE): reflexões para além
dos muros acadêmicos”, vinculado ao Centro de Ciências Biológicas e Sociais Aplicadas (CCBSA) da
Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) promoveu nesta segunda (29) pela manhã, no auditório do
Câmpus V, em parceria com o movimento estudantil Correnteza, a mesa intitulada “A impunidade do
passado justifica o presente: ditadura nunca mais”.
A atividade, que integra o evento “60 anos: por memória, verdade e justiça”, contou com a participação da
gerente executiva de documentação e arquivo da Casa José Américo e integrante do Comitê paraibano
memória, verdade e justiça e do Memorial da Democracia da Paraíba, professora Lúcia Guerra, e do
integrante do Comitê por Memória, Verdade e Justiça-PB e apresentador do programa Abrindo Mentes, na
Web Rádio Alta Potência, Zeca Mendonça. No turno da noite o debate reúne a filha e neta de Biu Pacatuba,
primeiro presidente das Ligas Camponesas de Sapé, respectivamente, Lúcia Malheiros e Giovana Malheiros,
e a socióloga e coordenadora do Memorial da Democracia da Paraíba, Fernanda Rocha.
Além das mesas de debate o evento conta com a exposição “Brasil nunca mais: 60 anos depois”, que está
disponível no Hall da Central de Aulas do Câmpus V com recortes dos casos apresentados no livro “Brasil
nunca mais”.
De acordo com o coordenador do MUDDE, professor Henrique França, Henrique França esse evento foi
idealizado a partir de uma preocupação com a apatia vivenciada na sociedade diante de discursos a favor
da volta da ditadura, repressão, que ensejaria um posicionamento da Universidade. “As universidades
sempre foram um campo de combate mais fértil a esse tipo de comportamento, então pensamos em
promover a exposição do livro Brasil Nunca Mais, e separamos depoimentos que acreditamos ser
importante resgatar para esse momento. E o diálogo com o movimento correnteza possibilitou a realização
das mesas de diálogo como forma de combater ditaduras, atitudes fascistas, totalitárias, e possibilitar o
contato com a história para nos tornar mais sensíveis a possíveis ameaças no futuro à nossa democracia”,
avalia.
A professora Lúcia Guerra lembra que as consequências e marcas desse golpe ainda estão presentes até
hoje porque não houve uma justiça de transição que punisse os crimes de assassinatos, torturas,
desaparecimentos. Segundo a pesquisadora, há diversos registros documentais que comprovam o papel
histórico da Paraíba, sobretudo a partir da mobilização de camponeses. Tal conteúdo está disponível no
Memorial da Democracia da Paraíba onde também se encontram depoimentos que foram gravados pela
Comissão Estadual da Verdade.
“É importante saber o que foi o golpe e a ditadura para que não se repita. Isso deve ser lembrado,
sobretudo, porque recentemente tivemos uma tentativa de golpe contra a nossa democracia, e só a partir
do conhecimento da população podemos conscientizar as pessoas a respeito do que é regime autoritário e
o que foi feito em nosso país, para agir no fortalecimento da democracia. Na Paraíba tivemos diversos
assassinatos, desaparecimentos, principalmente de camponeses que reivindicavam melhores condições de
trabalho. Então é preciso rememorar todo esse processo para assegurar que não retrocederemos a esse
tipo de conduta”, explica Lúcia Guerra.
Ao apresentar o contexto histórico em que se situou o golpe de 1964, o pesquisador Zeca Mendonça
buscou situar os estudantes presentes no evento a respeito do retrocesso civilizatório relacionado ao
período de ditadura militar. Ele enaltece que o conhecimento proporcionado às novas gerações permite
que, a partir das vivências do passado, seja possível atuar no presente para assegurar melhores condições
do futuro.
Sobre o golpe de 1964 na Paraíba
O início da década de 60 na Paraíba foi marcado por mobilizações dos trabalhadores urbanos e rurais. A
intensificação da urbanização, com o avanço do capitalismo no campo, propiciou o surgimento de práticas
trabalhistas. Nesse período, o tom das manifestações populares foi dado pelo movimento camponês,
através das Ligas Camponesas.
Em 1964, com a articulação do golpe que, na Paraíba, contou com a participação conjunta dos setores civis
e militares, alguns partidos políticos de orientação conservadora e jornalistas, ocorreu uma repressão
extensiva a vários setores da sociedade, mas, que se fez mais forte sobre as Ligas Camponesas,
consideradas como uma afronta aos grandes proprietários de terra e uma ameaça à subversão da ordem.
Um dos fatos marcantes do período na Paraíba foi o desaparecimento de dois líderes das ligas camponesas
de Sapé: Nêgo Fuba e Pedro Fazendeiro. Eles nunca foram encontrados.
Seguiram-se nessa época, casos de sequestro, tortura, assassinato e perseguição a estudantes, professores,
sindicalistas, magistrados, políticos, profissionais liberais, camponeses. Essas situações são comprovadas
pelos depoimentos reunidos pela Comissão Estadual da Verdade e pela documentação referente ao
Departamento de Ordem Política e Social (Dops) reunida e disponibilizada no Memorial da Democracia da
Paraíba.
Outras informações: https://www.cev.pb.gov.br/relatorio-final/cev-pb_relatorio-final.pdf.
Texto: Juliana Marques com informações do relatório final da Comissão Estadual da Verdade e da
Preservação da Memória do Estado da Paraíba