Entrevista com pesquisador do Câmpus V traz informações sobre o desenvolvimento da vacina para a Covid

10 de novembro de 2020

Muitas informações estão sendo publicadas e divulgadas acerca das vacinas para o Corona Vírus, e no intuito de diminuir a ansiedade e fornecer informações reais, ajudando a esclarecer fatos e desmistificar falsas informações, professor Francisco Jaime, que é doutor em Farmacologia e docente do curso de Ciências Biológicas do Câmpus V da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), traz informações atualizadas sobre o assunto.

1. Quais informações atuais você poderia nos dar sobre o desenvolvimento de uma vacina para a COVID?

Segundo os dados mais atualizados da Organização Mundial da Saúde, 44 vacinas estão em estudos clínicos (que é a fase que testa a vacina em seres humanos), sendo que 10 delas estão em fase 3, que é a última fase de testes antes da vacina poder começar a ser utilizada pela
população em geral. Dessas 10 (dez), 4 ou 5 estão em estágio mais avançado, que são: CoronaVac da Sinovac Biotech; ChAdOx1nCov-19 da Astrazeneca &amp, Oxford; BNT162b2 da Pfizer &amp, BioNTech; mRNA-1273 da Modena; Ad26.COV2-S da Johnsos & Johnson;

Pelo menos três dessas vacinas (“CoronaVac”, e “Vacina da Oxford” “Vacina da Pfizer & BioNTech”) começaram a ser testadas em julho desse ano, inclusive com voluntários brasileiros, e tem previsão de publicar os primeiros resultados dessa fase 3 agora em novembro de 2020.

É importante ressaltar que esses resultados que deverão ser publicados ainda nesse mês de novembro serão os primeiros resultados da fase 3, e não o estudo da fase 3 completo, que só deve acabar em 2021-2022. Isso não quer dizer que as vacinas só serão produzidas e disponibilizadas após término desses estudos de fase 3. Visto que esses primeiros resultados já podem dar muitas informações sobre a segurança e eficácia dessas vacinas.

Vale destacar também que no dia 9 de novembro a Pfizer divulgou informações preliminares desse estudo que indicam que sua vacina tem uma eficácia de 90%. Ou seja, de cada 100 pessoas que tomarem a vacina, 90 não se contaminarão com a COVID. É importante deixar claro, que essa eficácia só tem validade de 6 meses, que é aproximadamente o tempo que a fase 3 está em execução. E só com o passar dos meses, e
com a continuidade desses estudos clínicos que a empresa poderá afirmar se com o passar dos anos essa eficácia se mantém ou diminui.
Alguns podem achar que essa eficácia de 90% é baixa, porém é preciso esclarecer que para a Organização Mundial da Saúde, qualquer vacina que tem eficácia acima de 50% é considerada viável, pois na pior das hipóteses está garantindo que mais da metade da população não ficará doente.

2. O que falta para a população começar a ser vacinada?

As informações extraoficiais (uma vez que só poderá ser afirmado depois dos resultados publicados) indicam que todas essas vacinas que estão em fase 3, são seguras e eficazes e por sua vez poderão ser utilizadas pela população após o registro na ANVISA. Um dos motivos que me permite alegar isso, se deve ao fato de todos os testes clínicos dessas vacinas continuarem em desenvolvimento. Houve pontuais pausas para averiguação de possíveis mortes ou efeitos colaterais, mas foram pausas rápidas e os testes tiveram continuidade. Avalio que com a publicação desses primeiros resultados dos estudos clínicos de fase 3, os fabricantes já formalizem o registro dessas vacinas nos países.

Vale ressaltar que isso não é um procedimento comum e corriqueiro, visto que em condições normais, o registro só é pedido após conclusão dos testes clínicos. Porém como estamos em um estado de emergência, muitas agências regulatórias dos países, a exemplo da nossa ANVISA, irão abrir exceções e analisarão os protocolos de pedido de registro com maior agilidade (em menor tempo) e sem todas as
exigências de um processo corriqueiro. Esses protocolos de registro incluem análise do processo produtivo, da certificação da fábrica
que irá produzir a vacina e do produto (vacina), além do resultado da eficácia (estudo clínico de fase 3).

Depois de registrado e autorizado pela ANVISA, a vacina poderá ser comprada ou produzida e distribuída para população. Como também estamos numa situação mundial excepcional, alguns desses laboratórios que estão com vacinas em fase 3 já começaram a produção de lotes das vacinas, mesmo sem ter garantia que serão aprovadas para uso nos países. Com isso elas estão tentando acelerar o processo de venda/distribuição, permitindo que logo que as vacinas sejam aprovadas pelas agências regulatórias, já existam alguns milhões de
doses disponíveis para os países iniciarem o processo de vacinação.

3. O que você pode dizer sobre as vacinas russas, que já foram autorizadas na Rússia? 

O governo russo, autorizou a vacinação de sua população por duas vacinas desenvolvidas na própria Rússia. Trata-se da vacina Sputink-5 (que foi a primeira a ter o registro autorizado), e mais recentemente a vacina Epivac Corona. É preciso deixar claro que cada país tem soberania para decidir sobre a aprovação de uma vacina, ou um novo medicamento para uso por sua população. Por isso que existem
medicamentos que são proibidos em uns países e em outros são liberados. A China também já fez uma autorização especial para uso emergencial da vacina produzida pela Pfizer & BioNTech em seus profissionais da área da Saúde. Os maiores problemas dessas duas vacinas russas, é que elas não passaram pela fase 3 dos testes clínicos, onde a vacina é testada num grande número de pessoas, com diferentes faixas etárias, sexos, etc. Além disso, os resultados publicados com dados das fases clínicas 1 e 2, indicam muitos problemas de metodologia, como por exemplo o uso de um número muito pequeno de voluntários, a não condução de estudos duplo-cegos, o não uso de grupos placebo para comparação dos dados. Esse conjunto de dados que faltam fazem com que essa vacina não seja considerada eficaz e segura, por não ter seguido um protocolo considerado científico.

Porém ressalto, que apesar de tudo isso, a segurança e eficácia dessas vacinas podem ser confirmadas também num futuro próximo, visto que os estudos de fase 3 estão sendo realizados. Mas a maioria dos países, onde inclui-se o Brasil apenas irá autorizar o uso dessa vacina, ou
de qualquer outra vacina após conclusão total dos ensaios clínicos.

4. O que você pode dizer sobre a vacina que será produzida no Brasil pelo Instituto Butantã, ela permitirá acelerar vacinação da população brasileira?

O instituto Butantã, é um dos principais produtores de vacinas, se não o maior produtor de vacinas para a população brasileira. Portanto é uma instituição renomada e com expertise para produção de uma nova vacina. A vacina que será produzida pelo Instituto Butantã será a CoronaVac que está sendo desenvolvida pela da Sinovac Biotech, e essa é uma dessas vacinas que se encontra em estágio mais avançado da fase clínica 3, portanto deve ser uma das primeiras a ter o pedido de registro junto a ANVISA.

Não tenho/tive acesso aos termos da transferência de tecnologia feito entre a empresa chinesa e o Butantã, o que está divulgado nos sites oficiais das empresas é que o acordo prevê que o laboratório Chinês enviará 6 milhões de doses para o Brasil para vacinação imediata e
em seguida o Butantã poderá produzir no Brasil mais 40 milhões de doses imediatamente. No final de outubro a ANVISA autorizou a importação dessas 6 milhões de doses da vacina, que serão armazenadas pelo Butantã até que a ANVISA autorize a aplicação na população.

O Butantã prevê que caso não haja nenhum imprevisto adicional, seja na publicação dos resultados, na importação das materiais primas, na análise da ANVISA, entre outros fatores, que a partir do começo do ano que vem, ela poderá produzir e disponibilizar para a população mais 40 milhões de doses. Tendo lotes adicionais sendo produzidos na sequencia, perfazendo quase 100 milhões de dose até o meio do ano 2021 (o que permitiria vacinar metade da população brasileira, no caso da vacina ser aplicada em dose única).